31 outubro 2006

CAMA NOVA, LENÇÓIS BRANCOS E A VELHA COMPANHIA

Eu penso que estou ficando velha desde que eu tinha 19 anos de idade. Hoje, praticamente uma anciã, sinto sinais claros de envelhecimento. Não que meu espelho esteja acusando alguma coisa. Minha pele continua lisinha apesar de tanto sol e tanta bronca do meu dermatologista. Meu corpo está melhor hoje do que quando eu tinha 20 anos e um personal trainer. Meu cabelo finalmente passou do loiro-arregalado-paquita para um tom que combina mais comigo. A gente vai criando certas noções com o tempo. E, talvez, esses sejam os sinais mais evidentes de que estamos envelhecendo.

Depois de muitos carnavais, micaretas e shows de bandas que nunca fizeram a mínima diferença na minha vida, eu comecei a só beijar pessoas que vão fazer alguma diferença. Depois de me envolver com caras bacanas e caras idiotas, caras legais e caras chatos, caras sarados e caras flácidos, comecei a perceber que o cara certo não tem um rótulo. Ele simplesmente te quer. A idade, ou a maturidade, ou o envelhecimento... ou seja lá o que for, me fez perceber que é muito adolescente esse negócio de querer quem não quer a gente. Hoje, se o cara não me quer, sinto muito. Vá cantar em outro terreiro. Sei exatamente o que quero pra mim. E, definitivamente, quero alguém que me queira.

Mas o sintoma mais grave de envelhecimento está por vir: ando fazendo compras na M.Martan. Isso mesmo. Por dois domingos consecutivos, saí do shopping carregando sacolas que não cabiam no porta-malas do meu carro. Edredons, lençóis, travesseiros. Que pessoa da minha idade gasta tempo e dinheiro com coisas de casa se ela não vai se casar nem está mudando de apartamento? Sim, uma pessoa que se casou com ela mesma (e que também está em constante mudança). Uma pessoa que comprou uma cama gigante (gigante!!!) pra dormir sozinha. Que comprou lençóis brancos e um edredom de 2,80m pra esquentar ela mesma. Uma pessoa madura o suficiente pra gostar da sua própria companhia. Uma pessoa que não ocupa o espaço sobrando na sua cama com pessoas que sobram na sua vida. Uma pessoa que também não vai ser sobra na vida de ninguém. E, sim, essa pessoa sou eu.

Envelhecer tem seu preço. Você fica muito mais exigente. Você quer lençóis 100% algodão com num sei quantas centenas de fios (entendo tudo de lençol agora!). E você não importa de pagar mais caro por isso. Você quer um cara que seja 100% seu (continuo sem entender nada de homens!). E você vai pagar o preço que for pra isso. Você exige qualidade e durabilidade. Exige material de primeira linha. Você não compra mais roupa de cama que acaba na primeira lavada. Você não tolera relacionamentos que desbotam depois da primeira noite. Você não quer tecido que tenha nem 10% de poliéster. Não quer 15 caras te ligando se nenhum deles te interessa.

Ando nessa fase de lua-de-mel com a cama nova e comigo mesma. Curtindo minha própria companhia. Pintando as paredes do quarto. Jogando fora os lençóis velhos. Dando pros outros os relacionamentos antigos que eu não quero mais. Me reciclando. Amadurecendo. Tecendo meu casulo novo pra criar asas e virar borboleta. Passando por um processo de transformação pra crescer. E o melhor disso tudo? Esse é o tipo de casamento que dura pra sempre.

23 outubro 2006

A NOSSA LIBERDADE É O QUE NOS FAZ SEGUIR EM FRENTE

Dia desses, coloquei no messenger uma frase da Fernanda Mello que eu gosto muito: “A nossa liberdade é o que nos prende”. Não por nenhuma razão específica. Simplesmente porque acredito que a liberdade pode ser realmente a única coisa que prende duas pessoas que não têm a mínima intenção de se comprometer. Ficantes, como chamamos hoje. Mas, e aí? Se essas pessoas não têm intenção de se comprometer, quando e como vai ser o fim (daquilo que nem começou)?

Você sai de casa. Coloca um scarpin novo. Veste a roupa que mais combina com seu estado de espírito. Estampa na cara seu melhor sorriso. Sua melhor maquiagem. E vai pra melhor festa da cidade. E, toda festa, as mesmas músicas tocando. As mesmas caras te olhando. Os mesmos papos rolando. A mesma boca te beijando. Os mesmos braços te segurando. O mesmo cidadão te desejando. Mas isso, por enquanto, basta. A noite-sem-dia-seguinte tá valendo pra vocês.

Mas, e aí? Até onde vai? Até onde vocês dois podem ir, brincando de usar corpos na madrugada, sem se machucarem? E, se essa liberdade que vocês têm é tão grande assim, porque estão sempre um com o outro? Por que, toda vez que vocês se encontram, vocês colam um no outro? Cadê a porra da liberdade? E a hora que vocês estiverem na mesma festa e um de vocês se interessar por outra pessoa? Cadê, de novo, a porra da liberdade que vocês têm que faria você dizer “tudo bem”?

Não tem nada de “tudo bem”. Você fica tensa. Seu coração dispara. Sua boca seca. Você deseja sumir. Você deseja que o cidadão suma (da sua vida, claro). Você deseja nunca ter estado ali naquela noite. Você se pergunta porque foi mesmo que essa história começou. E quando era pra ter terminado. Só que você pulou essa parte. E por que foi mesmo que você pulou a parte em que você coloca um ponto final nessa história? Ah, é. Não é tão simples assim. Como se encerra um vínculo que não existe? Por que é tão difícil colocar um ponto final? Será que é porque a porra da liberdade prende vocês?

É assim mesmo que você fica. Irritada. Puta. Falando palavrão (cadê os bons modos que a dona Kátia ensinou?). Você se sente no direito de tirar satisfação com o cidadão que não é nada seu. Vocês discutem. Isso mesmo. Você discute com o cidadão que – insisto – não é nada seu. Muita intimidade pra vocês (ah, só uma observação: o conceito de intimidade, hoje, é um pouco diferente. Fazer sexo no elevador com câmera, tudo bem. Discutir sobre o que incomoda... não... muita intimidade). Então, cadê a PORRA da liberdade que faria você dizer “foda-se” nessa hora? Onde, caramba, estava a liberdade quando o cidadão cismou que viu você dar seu telefone pra outro cara e saiu emburrado? Que pseudo-liberdade é essa que te prende e te deixa tão solta? Onde, diabos, estava a merda da liberdade quando você mais precisou dela???

Você não sabe. Não quer saber. Não tem mais paciência pra ficar se perguntando. Pra ficar enchendo os textos de interrogações. Pra fazer seus leitores engolirem tantos palavrões. Os problemas assumem dimensões maiores do que deveriam ter. Se duas pessoas são livres, elas deveriam ser livres pra fazer o que bem entenderem sem se importarem uma com a outra. E por que não é assim? (Não espere uma resposta no final do texto porque eu também não sei). Por que você se importa tanto se, pra ele, tanto faz? Por que você quer alguém que só te quer quando convém? Por que tem tanta interrogação onde deveria ter um ponto de afirmação? Ou um ponto final. Ou um texto novo. Um texto com menos interrogações e mais exclamações. Uma poesia, quem sabe. E, por falar em poesia, não vou discordar de Fê Mello. Apenas coloquei uma nova frase no messenger: “A nossa liberdade é o que nos faz seguir em frente”.

P.S.: A gente fica tristinha, mas acorda no dia seguinte com uma bunda sem celulite e um cartão de crédito sem limite e tudo volta ao normal!

09 outubro 2006

A VIZINHA GOSTOSA DO PRÉDIO DA FRENTE

Da janela de seu apartamento, aquele cidadão observa todos os movimentos da vizinha do prédio da frente. Ele observa ela trocar de roupa. Lavar a varanda usando roupa de ginástica. Almoçar sozinha nos finais de semana. Passar a madrugada de calcinha na frente do computador. Assistir TV em alguns raros momentos. Conversar com seu passarinho. Tomar vinho. Receber os amigos. Ele sabe quando ela não está em casa. Sabe que horas ela chega do trabalho. Que horas sai pra academia. Sabe quando ela viaja. Sabe quando ela tem visita. Da janela do seu apartamento, ele acompanha tudo que acontece com aquela cidadã. E ela parece tão linda e loira. Tão meiga. Tão sexy. Ela parece uma menina que precisa de colo. E, ao mesmo tempo, uma mulher tão independente. E ela tem aquele cabelo dourado enorme. Aquela pele bronzeada. Aquele corpinho de passeio. Mas, ele nunca a viu de perto. Se um dia cruzar com ela na rua, é provável que não a reconheça. Porque, de perto, essa cidadã é muito diferente.

De perto, essa cidadã não é tão simples assim. De perto, ela é complicada. Mimada. Chata. Exigente. Temperamental. Egoísta. Vingativa. E, se ele a olhasse nos olhos, talvez ele nem achasse tanta graça nela assim. De perto, essa cidadã tem olheiras quando está cansada. Ela volta pra casa suada depois da academia. Ela fica com a raiz do cabelo por algum tempo sem retocar. Ela tem umas espinhas no rosto. Tem uma cicatriz perto do umbigo. Tem uma mancha no meio do peito. Ela inventa uma TPM pra justificar seu humor oscilante. Ela esquece de levar a roupa pra lavanderia. E ela odeia esquecer coisas. Ela odeia acordar cedo. Ela odeia que puxem seu saco. Odeia gente interesseira. E ela adora elogio. Adora um carinho sincero. Adora que a olhem nos olhos. Adora pessoas transparentes.

Se o tal cidadão conhecesse aquela vizinha, ele veria muito mais coisas do que ele vê de longe. Ele veria que, por trás daquela carinha feliz, se esconde uma menina. Insegura. Carente. Desconfiada. Vivida. Descrente. Que, por trás daquela cidadã bem resolvida, tem uma mulher que não sabe o que quer da vida. Que já teve seu coração dilacerado e agora procura os pedaços que sobraram por aí. Procura numa festa. Numa mesa de bar. Numa companhia agradável. Num telefonema no meio da tarde. Num convite pra passar a noite. Numa viagem de final de semana. Procura em lugares que ela não vai encontrar. Procura em lugares onde ela não vai encontrar nada além de pedaços soltos. Pedaços dela mesma que ela esqueceu de juntar. Pedaços de noites mal dormidas. De pessoas descartáveis. De festas com muito sorriso e pouca alegria. Com muita gente e pouco calor humano.

A vizinha que tira a roupa sem pudores e que não mostra a alma. Que adora mostrar o corpo mas não mostra o que vai lá dentro. Que adora quando elogiam sua barriga, mas que se desconcerta se elogiam seu caráter. Que conhece todas as quinhentas funções do seu telefone celular mas não consegue apertar um único botão e ligar pro cara de quem ela gosta. Que manda mensagens com fotos quando deveria mandar um convite pra sair. Mas isso, o tal vizinho não sabe. E, mesmo que eles morassem no mesmo prédio e freqüentassem a mesma piscina nos finais de semana, ele nunca saberia. Então, ele continua da janela do 901 observando a vizinha gostosa. Sem ter a mínima idéia do que se passa ou de quem ela é. E talvez ele nem queira saber. Pra ele, o que ele sabe é suficiente. Pra pessoas que não têm a mínima intenção de se envolver, é melhor que se olhem de longe mesmo. Assim, a vizinha continua linda e loira (e gostosa!) e ele continua sonhando com ela todas as noites.

..............................
P.S.: Queridos, o vizinho do 901 é fruto da minha imaginação. E quanto à cidadã, ela manda avisar que fecha a cortina quando está de calcinha na frente do computador. Rsrs
Beijos e boa semana.